sábado, 21 de junho de 2008

O CHORUME - CINEMA

Por Raphael Dias Nunes


CINEMA CRÍTICA:
ANTES QUE O DIABO SAIBA QUE VOCÊ ESTÁ MORTO
Dirigido por Sidney Lumet. Com: Philip Seymour Hoffman, Ethan Hawke, Albert Finney e Marisa Tomei.


Preceitos em Cheque
Dois irmãos planejam um roubo a uma joalheria. Entretanto, a loja pertence à família dos irmãos. O assalto dá errado, tudo dá errado. Este é o cenário do Drama muito bem montado por Sidney Lumet. No longa, a ação dos personagens coloca em cheque valores morais e preceitos sociais. E abre espaço também, para discussões sobre relações familiares conturbadas.

A história, que gira toda em torno do roubo, é seguida por um roteiro não-linear: Sem uma ordem cronológica exata, com idas e vindas em relação aos dias que antecederam e procederam a data do assalto. Com isso, algumas cenas chegam a se repetir, fazendo com que haja compreensão geral do fato, sob diversas perspectivas. Este recurso torna a história mais intrigante, pois ao longo do desenrolar da trama, toda ação (mesmo que banal) tem uma lógica, tudo se encaixa. As atuações brilhantes de Philip Seymour Hoffman (como Andy Hanson, o irmão mais velho) e Ethan Hawke (como Hank Hanson, o irmão mais novo), dão o capricho final a este filme polêmico, dramático e muito bem-feito.

Apesar do ato do assalto ser a referência para todos os demais acontecimentos do filme, a questão principal fica por conta das relações familiares. O que leva a crer, antes de qualquer julgamento primário, que o roubo foi apenas o estopim de uma crise trágica já anunciada. O que de fato, motivou os dois irmãos a conspirarem contra a própria família? Achar que seria fácil e seguro? A decisão deles não fora motivada somente pelo drama pessoal que cada um deles atravessava. O medo do fracasso profissional/ financeiro/social e o conseqüente desespero resultante, tiveram clara influência. Mas não foi apenas isto. Entram em jogo também, questões traumáticas de relações conturbadas entre pai e filho, e até entre os próprios irmãos. O filme mostra, em uma de suas mais importantes cenas, o sentimento de revolta contra o pai, guardado pelo filho primogênito, por se sentir renegado em sua infância. Mostra a semelhança gritante entre o pai e o filho, por mais que eles estivessem ressentidos um com o outro. Nada disso é mostrado ao acaso. Tudo se fundamenta, se encaixa. Existe uma lógica (ir)racional dentro de todo esse contexto. E a soma de todos esses elementos configura um desfecho semelhante a uma tragédia grega.

E que tipo de reação teria a família, ao descobrir que os responsáveis pela tragédia foram seus próprios membros? O que o caberia ao chefe de família? Quais os limites para uma total ruptura de núcleo familiar? E onde que pode estar o erro de um pai em toda essa história? Até onde são os limites da vergonha de expor um fato que revoltaria toda uma sociedade? Deve-se liberar a eutanásia?

Essas e outras possíveis questões serão o ponto de debate para o espectador que deixar a sala, após este bom e polêmico filme.


Um comentário:

Bia A. Porto disse...

É isso mesmo, o filme "coloca em cheque valores morais e preceitos sociais", discutindo "relações familiares conturbadas". A família é a célula da sociedade, né? No caso, personagens c/ comportamentos tão autodestrutivos são uma célula cancerígena.
Boa resenha, boa dica do CHORUME!